sábado, 25 de dezembro de 2010

O pulso ainda pulsa... a impusividade.

A pessoa entrou, esbaforida, nervosa. Todos ao redor poderiam dizer que algo não estava certo com ela. Um olhar meio de louca. Chegou ao balcão da farmácia, bateu nele e chamou o atendente. Este olhou assustado pro ser humano em estado lamentável. Disse a pessoa:
- Por favor, gostaria de saber se tem um remédio... Sei que eu deveria consultar um médico, mas não tenho tempo pra isso.
- Que remédio seria, senhora?
- Não sei o nome! Você que tem que me dizer...
- Pra que seria então?
- Pra impulsividade.
Um momento de silêncio, o atendente pensou, olhou para as prateleiras cheias de remédios, e disse:
- Bom... tem o passivotril... Tem o genérico dele também, o passivolida de calmil.
- Hum, ótimo. Mas em quanto tempo começa a fazer efeito? Porque preciso pra ontem.
(Nessa hora a pessoa dá uma tremidinha, como se estivesse com frio. Lá fora fazia 32°C.)
- Olha, é um tratamento meio demorado... Começa a fazer efeito depois de duas semana de uso, mais ou menos.
- Não, não pode ser.
- Também tem uma outra opção... Aqui do lado tem uma farmácia de homeopatia, eles tem pra impulsividade o refletionum aeternum. Mas creio que demore mais pra fazer efeito que o passivotril...
Com um murro na bancada:
- Não! Não posso esperar, você não tá me entendendo.
(Desespero já tomando conta da pessoa.)
- Senhora, é o que dá pra fazer.
(Agora se alterando, aumentando o tom da voz. Em clima de confissão.)
- As pessoas acham que é fácil ser impulsiva. Somos vistos como gente engraçadinha, com um parafuso a menos. Mas digo o quanto se sofre. E não adianta vir com esse papo de pensar duas vezes antes de fazer. Em alguns casos, até podemos pensar duas, três, quatrocentos e vinte e sete vezes. Mas não deixaremos de agir. Talvez, tenhamos um pequeno "defeito" no crivo da razão. Até tentamos, mas a coisa acontece. Falamos, fazemos. E haja força de vontade de aturar as consequências. Arrependimentos... Que depois são transponíveis, com grande maestria. Já nos acostumamos. Mas chega uma hora em que não aguentamos. Bem, talvez não todos. Alguns até gostam de ser impulsivos, são adeptos do "melhor se arrepender do que não fiz do que do que fiz". Mas eu não. Não aguento mais. Não. Aguento. Cansei. Definitivamente.

Após essa verborragia histérica, a pessoa parece se acalmar. O atendente, resignado, diz:
- Bom senhora... Há uma outra opção. Talvez não tão fácil de ser aceita, mas com certeza mais rápida e eficaz.
(Ela quase pula em cima do atendente, numa pulsão desvairada.)
- O quê?? Diz agora, por favor. É algo injetável? Vai doer? Não me importo.
- É, pode-se dizer que sim... Mas quando for, na mesma hora você não sentirá mais NADA.
- Então, melhor ainda. Cadê?
- Mas não vende aqui. Só naquela lojinha do outro lado da rua. Ali. (Disse apontando pra fora da farmácia, a pessoa acompanhando a mão e o dedo em riste, e mirando nervosamente pra onde apontava.)
Do outro lado da rua, uma lojinha de armas.
A pessoa teve suas feições completamente modificadas. Parecia que tinha alçado a paz, o nirvana, encontrou a luz, escolha qualquer dessas epifanias que todas descreverão.
E sem se virar, agradeceu, e caminhou... Rumo à saída, à rua... ao outro lado da rua. À pequena lojinha de armas.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

To hell with the cats, or beyond

Caminhando na noite, confusa
Luz difusa
Assombra
Uma sombra
Que pensei ser um gato, saindo do mato
Não é primeira vez
Felino tem essa mania, já fez
A vocação pro parecer fluir, flutuar
De noite, ao luar
Parece que seu poder aumenta, teoria que se sustenta
Por povos, e adoradores
desses não amadores
Na arte de esvaecer, e aparecer
Quando tu menos esperas...
Deveras
Seres da noite, da escuridão. Podem causar pavor, com a destreza inata para ocultação
Ou manar amor, no âmago do mais amargo, sofredor
Digitígrado... Contigo, Como lido?
E não muito certa, mas teorizo, como nunca, desperta:
Oferecem contato com algo metafísico, portal a algo além...
E quem dirá que era sombra, ou gato, ou... quem?


*Tentativa absurda e incipiente de fazer poesia. E com rimas, que coisa, não?
Mas sem vergonha o suficiente pra postar.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

My way

Acordou como nasce, das profundezas do sono e de algum sonho confuso, sem muita noção do que estava acontecendo. Como sempre. Algo automático. Levantou, tomou banho, café e foi trabalhar. Quase sempre encontrava as mesmas pessoas passando, mas não poderia dizer. Começou a acordar, e com ele (o ato), a pensar, como de praxe. Sentiu-se acuada pelas pressões da vida. Tinha que trabalhar com o que mais se aproximasse do que gosta e como o sistema dita. Ganhar dinheiro. Aí vem a próxima fase (como um vídeo-game mesmo, essa vida): Precisa sair de casa. Ganhar outra casa. Viver outra vida. Não, não outra vida. Mas uma amálgama do seu eu anterior e posterior, como um divisor de águas. Incrível como não tinha medo. Quer dizer, até tinha, em alguns momentos de lucidez. Mas eram raros, não se deixava levar. E como momentos não lúcidos podem ser o melhor? Pois eles é que dão a coragem de fazer o que se quer, sem pensar muito sobre. Se jogar do precipício. De olhos fechados. Tiro no escuro. Num jogo mesmo de sorte. Escolham uma metáfora, todas bem aplicáveis. Se daria certo, bom, depois veria isso. Sentia ser esse mesmo o caminho a seguir. Morar sozinha. A sua melhor companhia era ela mesma, então, raios, não teria problemas com o inquilino. Só aumentaria sua cota de responsabilidades. Pagar contas? Sai na urina. Normal. Quer dizer, quando se lembra. Arrumar casa... Aí sim, um problema. Nunca foi muito organizada. Bom, diarista duas vezes por mês e o resto vai levando. Cozinhar? Gostava e sabia. Só não sabia se não teria preguiça. Fazer comprar no mercado? Algo meio complicado. Pois por mais que adorasse cozinhar, não gostava de escolher os alimentos. Frutas e legumes então? Chato. Mas era preciso. Mas o que era mais preciso ainda, era a tão almejada liberdade. Liberdade... Quase nunca tinha a chance de pronunciar tal palavra. Numa conversa com colegas de trabalho, disse ser essa a única recompensa de algumas atribuições que estariam por vir. Teria liberdade. Pra si mesma. Ser e fazer o que bem entende. Não dar mais satisfações. Isso soa como um sonho distante, em nuvens fofas e límpidas, e celestiais. Era algo que sempre quis. Sempre mesmo, já ensaiando nas primeiras independências da vida.
Desde pequena, quando lia nos seus livros suas heroínas independentes e felizes com isso, já sentia querer o mesmo. Feminismo soa muito forçado, não é isso. É simplesmente querer ser e ser de fato, o que se quer, independente do gênero do corpo em que foi "abençoada" sua alma. Sempre se indignou e rejeitou viver como a porra da sociedade quer ver uma mulher viver. Era o que era. Muitas vezes achou-se homem, no sentido do ser livre que é atribuído pela própria sociedade aos seres masculinos, por sentir essa liberdade transbordando pelos seus poros (tirando a parte, claro, da violência que se vê por aí. Ficar perambulando pela rua madrugada a fora, no Rio de Janeiro, não é independência, mas burrice). Sempre se deu melhor com os homens, pois entre eles não há travas de comportamento. Falam, agem como querem. Mas tem que admitir sentir muito orgulho e satisfação pelas mulheres que na vida seguem caminhos diferentes dos pré-traçados às mulheres em geral pela sociedade e/ou suas famílias. Uma conquista? Sim, é fato. Vida bandida, vida de cão, vida filha da puta mesmo essa. Então ser mulher era mais uma luta a se lutar. Mas não, não é feminismo. É tão demodê... nem só por isso. Separar as pessoas pelo seu gênero, francamente, só serve na hora das relações, digamos, no sentido bíblico (risos). Nas outras relações, não gosta de fazer distinções. Mas creio que muitas poucas pessoas pensem assim. Os próprios homens, que ela tão admira, fazem isso. Quando uma mulher está no meio, não tem como agirem do mesmo jeito. Paciência. Porém, admite, sente um pouco de repulsa e desprezo por mulheres femininas demais. Digo feminino aqui pejorativamente mesmo. Mas, contradizendo-se, ela também tem seu lado feminino. Fato, honesto. Admite (muitas admissões...).
Bom, já fugindo do que pensava inicialmente. Mas devaneios são inerentes ao ser humano. Nos levam a lugares muito diferentes do ponto de partida. E assim nascem as boas ideias. A quem se deixa levar, sem amarras de qualquer tipo, sem recalques (ai, Freud...), alcança coisas que, possivelmente, nunca seriam pensadas.
Volta então agora a sua questão principal: sua liberdade. Tudo novo. Conquistas. Cada dia vai matar um leão (não, leão não, gosta de felinos. Vai descascar um abacaxi por dia). Mas sabe ser necessário. E se sente contente. Como nunca. Só bate, às vezes, aquele medo normal (na verdade, não é medo. É cautela. Aff... Detesta essa palavra, tão covarde... medo soa mais íntegro. Que coisa), biologicamente incrustado nos seres humanos: inconscientemente, colocar na balança as chances de tal ato dar certo e não dar. Mas segue otimista seu caminho, otimismo esse propulsado pelo novo, pelo inesperado, coisa que adora e não vive sem em sua vida. É como um segundo tipo de ar que respira. Só aspirado pelos pulmões da alma. Espera dar certo. Vibra, gosta de mudanças radicais. Sair explorando, descobrindo. Vai precisar muito de sua boca. Pena que não é pra ir a Roma, mas, talvez, pra achar lojinhas, mercados (já pensando no seu novo bairro)... E vai se sentir feliz com isso. Se bastar pra ela mesma. Pega o ônibus e segue. Seu caminho. Meu caminho. Meu jeito.

Trecho da música My Way, famosa na voz de Frank Sinatra, mas composta por Claude François, Jacques Revaux e Paul Anka. Rola uma identificação:

"...Yes there were times, I'm sure you knew
When I bit off more than I could chew
But through it all when there was doubt
I ate it up and spit it out

I faced it all and I stood tall
And did it my way

I've loved, I've laughed and cried
I've had my fill, my share of losing
And now as tears subside
I find it all so amusing

To think I did all that
And may I say, not in a shy way
Oh no, oh no, not me
I did it my way

For what is a man, what has he got?
If not himself, then he has naught
To say the things he truly feels
And not the words of one who kneels

The record shows, I took the blows
And did it my way."

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Sem paciência

Sobre o post anterior: Não sei como em nome de Jesus fui-me esquecer de comentar sobre  um dos principais livros da minha formação em “Horrologia”: O Exorcista, de Willian Peter Blatty. O conheci também na minha ida adolescência, e é com certeza o livro que mais reli. Meu romance preferido. Minha recomendação, sempre.

*****

http://www1.folha.uol.com.br/poder/811187-d-odilo-scherer-defende-discussao-sobre-aborto-na-campanha.shtml
Após ler o texto deste link, indignei-me (quem me conhece, vê que fico indignada muito frequentemente. É que não tenho mesmo paciência pra estupidez humana. Se bem que estupidez humana é praticamente uma redundância).
Como se não bastasse ter que lidar com os acéfalos argumentadores (eufemismo este último, estou muito boazinha, pois na verdade não passam de pessoas que resolveram abrir a boca pra sair coisas néscias) na cena política, agora temos esse exemplo (mais um dos) da acefalia "formadora de opinião" da Igreja Católica. E, meu Deus, misturar os dois, que inferno na Terra (uso "meu Deus" e "inferno" como meras exclamação e expressão, não necessariamente dando a entender à qual crença a escritora deste texto segue).
Em que Universo, eu vos pergunto, a opinião de candidatos a cargos políticos sobre aborto, sob o viés religioso, deveria ser levado em consideração na hora de escolher tais candidatos? Nesse planetinha chamado Terra, onde a religião, segundos alguns (leia-se muitos), é fator vital. E agora, mais especificamente, no Brasil. Não que eu esteja fazendo apologia do aborto aqui. Mas, sendo mulher e passível de tal acontecimento, compadeço-me das que sofrem por essa escolha e tento me colocar no lugar. Então, acho assunto completamente pessoal, da mulher ou menina em questão.
A Igreja Católica considera criminoso e pecaminoso encerrar a vida de um bebê, mas fogem completamente do que é mais importante: da vida, já existente, da mulher. E também não consideram a possível vida de merda que esse bebê viria a ter. Pensando então, por exemplo, num caso de estupro. Os católicos acham que vai acontecer o que com a alma do estuprador? Ele está liberado ao reino dos céus, mas a garotinha de nove anos que teve a vida arregaçada (desculpem o trocadilho) vai arder no Inferno? Como isso funciona? E não considerando o post mortem, mas o aqui e agora? Como proceder? As mulheres devem seguir carregando o fruto desse crime tão abominavelmente hediondo? Bem, não consigo seguir lá muito imparcial né, já estou dando minha opinião pró.
Um adendo fora do cerne inicial dessa postagem: agora, se não for caso de estupro? Deixando toda e qualquer opinião religiosa de fora (não que eu tenha alguma formada), mas vendo somente com meus valores sobre a vida, acho que depende do caso, e não vou discorrer sobre minhas opiniões pessoais, o texto não é sobre isso (apesar de já ter opinado, não teve jeito). Como disse antes, decisão única e exclusivamente da mulher. E também do pai da criança, seja seu namorado, marido, companheiro ou qualquer coisa que o valha (não excluo, em hipótese alguma, a participação do homem nessa questão). Pra quem quiser saber, o que euzinha, Juliana, faria, sinceramente não sei. Precisaria estar envolta na situação pra saber.
Voltando à política, o Brasil mostra-se despreparado para levá-la a sério. Muito que evoluir ainda, creio eu, humildemente. Agora, misturar isso com religião é confundir demais a cabeça do médio cidadão, do qual é composta a maioria da população (sem querer ser escrota, mas já sendo, é a verdade e todos sabemos. A parte pensante desse país é minoria, e humildemente me incluo nela. Pode parecer paradoxal e irônico esse "humildemente", mas não é).
A Igreja Católica é como os EUA: adora meter o bedelho onde não foi chamada. E fica dando palpites completamente falhos e inúteis. E nesse caso, vejo aqui simplesmente algum conchavo entre políticos e esses arcebispos de merda, pra arrebanhar ou enfiar na cabeça dos já arrebanhados em quem votar. Infelizmente, sei que a maioria da população é sim católica, e como tal, tende a usar esse viés nas suas escolhas na vida. Tá, não só no catolicismo. É  a essência de toda religião ser doutrinadora nos valores, na ética, no rumo da vida em geral das pessoas.
Acredito no Estado Laico. E o Brasil seguiu muito tempo sendo. Mas agora, já não sei... Entristeço-me com essas coisas. Muito barulho por nada, muito foco no que não tem que ser levado em consideração. O que é importante fica só no plano das ideias, não é discutido. Vejo essas coisas como um tipo de "entretenimento", algo pra desfocar do que realmente tem que ser discutido. Religião, de certa forma, é isso aí. E engraçado, é um assunto que me intriga muito. Gosto de estudá-las cientificamente, entender os processos, como se criaram, antropológica e socialmente falando. Mas não consigo ver minha vida inserida em algum tipo de doutrina, acho tudo isso muito castrador da essência humana. Ter um lado espiritual, exercitar a espiritualidade pode até ser necessário, mas realmente, como boa agnóstica, não sei.
Meu radicalismo em relação a pessoas religiosas diminuiu um pouco (era MUITO), não trato ninguém diferente só por ser crente, judeu, hindu ou o raio que o parta (neste último podem-se incluir as religiões pagãs. Se bem que eu as admiro muitíssimo mais). Mas lá no fundo, não consigo ter um relacionamento normal com pessoas muito religiosas. Se bem que das religiões que conheço algo, a que mais respeito é o espiritismo. Até já me considerei espírita por um tempo, mas por não concordar com algumas coisas, achei melhor me “desconsiderar”. Enfim, assunto demasiado complexo pra uma postagem, e essa já está extensa por demais.

P.S.: Um bom texto a ser lido como complementador, esta entrevista com Ciro Gomes; concordo, em algumas partes, com o que ele fala: http://www.outroladodanoticia.com.br/10/2010/ciro-gomes-mistificacao-em-torno-do-aborto-e-calhordice/

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Horrify yourself

Fiz uma visitinha bem agradável ao dentista hoje, com direito a brocas, lixas, agulhas e outros objetos medievais. Uma delícia! Refiz a resina de um dente que quebrei aos meus 9 anos (com o guidão da bicicleta, bicicleta essa que peguei escondido da minha mãe na ocasião. Bem feito pra mim). Ainda faltam também uma meia dúzia de tratamentozinhos, para então, enfim, colocar aparelho! Eu sempre quis colocar, sonho de infância. Não que eu realmente precise, me acho apenas levemente dentucinha. Mas é mais pelo monte de metal na boca, sempre achei lindo (é, é estranho mesmo).

*****
Lembrei-me de um conto que li semana passada, do meu querido Poe, Berenice. Segue spoilers, então quem quiser ler o conto, não continue.
Não vou contar o conto todo. Berenice é no conto, prima do protagonista, com quem ele se casa. E após o casamento, Berenice outrora mulher cheia de saúde, de vida (em contraposto com o protagonista, doente e monomaníco, como ele próprio se chama), após o casamento começa a definhar. Parto agora para o desenrolar do final do conto, onde o o protagonista (conto em 1a. pessoa) começa a revelar um intenso e maníaco interesse pela arcada dentária de Berenice. E, como a doença progride e a leva à morte, pode-se imaginar o que ocorre no final do conto. Se vocês não conhecem muito a literatura poesca, ou se, realmente dei poucos dados para tal, não adivinharão o que ocorre (bom, eu deduzi, visto meu treinamento em sua literatura). Sim, isso mesmo. Ele, num ato insano, de loucura inconsciente (convenientemente, ou não, ele não se lembra do ocorrido), arranda no canto do quarto (adoro isso).Poe é meu grande amor literário. Desde minha adolescência incipiente, quando minha nobre mãe presenteou-me com um exemplar de Histórias Extraordinárias, coletânea de 13 contos dele, livro que leio e releio desde então. Encontra-se nele Gato Preto, A Queda da Casa de Usher (esses entre meus favoritos), e alguns detetivescos, com Dupin,  precursor do Poirot da Agatha Christie (desculpe Poe, mas essa você perde. Nas histórias policiais, Christie é a senhora, não tem jeito): A Carta Roubada, Os Crimes da Rua Morgue, entre outros. Eu sou suspeita para falar de contos (minha forma literária favorita), já li quase todos dele. Já a coletânea Contos do Grotesco e do Arabesco, que ardentemente procuro, me parece não ter uma única ediçãozinha traduzida para o português. Contento-me lendo seus contos por fora. Das suas outras incursões literárias há os poemas, claro. Apesar de muito famoso por causa deles, não li muitos. Na verdade só conheço O Corvo e Lenore. Não sou muito fã de poemas (tirando Drummond, mas isso é outra história). Falta-me também ler seu único romance, As narrativas de Arthur Gordon Pym. Enfim, ele é o mestre do Horror. Psicológico, ou não. Onírico, ou não. Policial, ou não.
Só pra ilustrar, uma passagem como exemplo da capacidade poesca de nos inserir no seu mundo de horror, de mergulhar nossa mente nos microcosmos por ele criados. De nos dar todo o arsenal para facilmente sentirmos o clima, a tensão, a lugubridade:
"[...] Com o coração pesaroso, ainda que relutante e oprimido pelo medo, dirigi-me para o quarto de dormir da falecida. Era um quarto grande, muito escuro e a cada passo dado naquele sombrio interior defrontava-me com aprestos do enterro. Os cortinados do leito, assim me disse um criado, recobriam o caixão, e neste, sussurrou-me ele, se achava tudo o que restou de Berenice. Teria alguém me perguntado se eu não queria olhar o corpo? Não vi ninguém mexer os lábios, entretanto a pergunta havia sido feita e o eco das sílabas ainda ressoava no quarto. Era impossível recusar e com uma sensação de asfixia avancei vagarosamente na direção do leito. Ergui de leve as negras dobras dos cortinados. Ao largá-las, elas caíram sobre meus ombros e, ocultando-me assim dos vivos, envolveram-me numa estrita comunhão com o cadáver. A atmosfera se impregnara inteiramente do odor da morte. O cheiro peculiar do caixão me fazia mal e cheguei a supor que emanações deletérias já exalavam do corpo. Teria dado mundos para fugir dali – voar para longe da influência perniciosa daquele ambiente mortuário – respirar uma vez mais o ar puro dos céus eternos. [...]"


*****
Aproveitando o ensejo, farei algumas sugestões desse gênero da literatura, o mais lido por mim nesse pequeno ínterim de vida. Robert Louis Stevenson, autor do famigerado O Médico e o Monstro, e do ótimo mas não tão famoso O Ladrão de Cadáveres; O de lei Frankstein de Mary Shelley (embora do terror, lógico, creio que há muito de filosófico também); Anne Rice, a precursora das histórias de vampiros (pra mim, porque pra muita gente é aquela cujo nome não lembro e que começou com aquela desgraça na vida de quem gosta de vampiros de verdade, a série Crepúsculo), com suas Crônicas Vampirescas: o melhor Entrevista com o Vampiro e o também ótimo Lestat (as outras ainda não li). A Rainha dos Condenados, confesso, parei no meio. Não recomendo, deveras enfadonho; O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde; Agatha Christie, apesar de ser considerada literatura policial, na minha visão, alguns romances dela possuem uma aura de tensão bem semelhantes às criadas nos livros de horror, sem falar das mortes engendradas com requintes de criatividade acima da média. Os melhores dela são sem dúvida os casos de Poirot. Não curto muito quando ele não aparece. Recomendo Cipreste Triste, O Natal de Poirot e claro, o genial O Caso dos Dez Negrinhos (esse último que, junto com Psicose, com certeza inspiraram o maravilhoso filme Identidade). Não posso deixar de citar H.P. Lovecraft, embora eu só conheça contos menores. Não, ainda não li O Chamado de Cthulhu. Ah, forçando um pouco a barra, porque não é essencialmente horror, apesar de poder suscitar algo do tipo (considero com certeza um conto fantástico), tem O Curioso Caso de Benjamin Button, de Fitzgerald, presente no livro Seis Contos da Era do Jazz (nota: preciso comprar). Enfim, eu ainda sou garota, há muito o que ler e conhecer dentro dessa literatura. Dentro da poesia, além dos do Poe, acho ótimo também As Flores do Mal, de Baudelaire. Baudelaire, aliás, foi amigo de Poe (por correspondências), traduzindo muito de sua obra para o francês. Só imagino sentar num Café com esses dois, que coisa maravilhosa e onírica e utópica de se pensar.
Acima, praticamente citei os clássicos, bibliografia básica dos amantes do gênero. Mas, uma boa recomendação é a coletânea feita por Manguel Contos de Horror do Século XIX, pela Companhia das Letras. Boa pra conhecer os melhores contos dos autores menos endeusados do gênero. Particularmente, adorei A Volta do Parafuso* (horror essencialmente psicológico, e um tanto intragável. Mas vale a pena insistir), de Henry James; "A Família do Vurdulak", de Aleksei Konstantinovitch Tolstói (não é o Tolstói de Ana Karenina. Mas é parente dele, acho); O Travesseiro de Penas, de Horácio Quiroga (maravilhoso este); Uma Vendeta, de Guy de Maupassant. Curiosamente, o exemplar de Poe é Os Fatos no Caso do Dr.Weimar, que sim, é muito bom, mas há outros, como Berenice mesmo, muito mais dignos de figurar nessa coletânea. A coletânea é perfeita, mas claro que sempre poderia ser mais extensa. A gafe fica por conta de terem traduzido O Ladrão de Cadáveres (The Body Snatcher) de Stevenson como O Rapa-Carniça. Sofrível.

*****
Outra literatura, mas essa é muito mais underground e pode gerar certa polêmica, pois muitos podem pensar não ser digna como literatura (pelo menos acho que nunca entraria para o cânone): são os Romances de Clã, baseados nos clãs de vampiros de Vampire, um universo de RPG. Já li sobre Gangrel, mas é meio difícil de achar todos os clãs. Eu particularmente, os considero muito boa literatura, são muito bem escritos. E o legal é que qualquer leigo em Vampire pode ler, não há necessidade de muito conhecimento prévio sobre o assunto.



*****

Claro que deixei MUITA COISA de fora, mas como disse, ainda sou garotinha. Mas para quem é fã do gênero, há sempre o que buscar. Sempre sedentos de sangue, e mais sangue... rs.


* Nota no final porque dentro de parênteses ia ficar horroroso de grande: adoro a polêmica em torno do título, que em inglês é Tighten The Screw, Give The Screw Another Turn, que literalmente em português traduz-se "apertado o parafuso, dê ao parafuso outra volta". Mas seria uma expressão, que diria: "Colocar pressão em algo que já está em situação aflitiva". A expressão lembra o "thumbscrew", aparelho de tortura medieval em forma de anéis. Outra coisa a dizer, é que com quase 100% de certeza, quem fez aquele filme genial e no top 10 dos meus preferidos, Os Outros, leu esse conto, visto as similaridades.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Sólo un caso de la melancolía.

"[...]Na noite de seu aniversário cantei para Delgadina a canção completa e beijei-a por todo o corpo até ficar sem respiração: a espnha dorsal, vértebra por vértebra, até as nádegas lânguidas, o lado da pinta, do seu coração inesgotável. À medida que a beijava aumentava o calor do seu corpo e ela exalava uma fragância de montanha. Ela me respondeu com vibrações novas em cada polegada de sua pele, e em cada uma encontrei um calor diferente, um sabor próprio, um gemido novo, e ela inteira ressoou com um arquejo, e seus mamilos se abriram em flor sem ser tocados[...]" Memoria de mi Putas Tristes. Gabriel García Márquez.


Li esse livro tem um tempo, mas esse trecho não me sai da memória. E hoje está demais. Já li muita literatura que pode ser considerada erótica, não necessariamente com esse objetivo, mas com passagens bem lascivas. Lolita. Casa dos Budas Ditosos. Satíricon. Lisístrata, de Aristófanes. Bukowski. Contos de Rubens Fonseca. Não me perdoo, Sade ainda não li. Sem contar alguns livretos na minha adolescência, literatura medíocre, aqueles com nome de mulheres, que vendem nas bancas de jornal. Mas não entendo, esse livro, mais especificamente esse trecho, me tocou de um jeito, que não sei explicar. Gostaria de ter sido eu a escrever. Mas García Márquez (assim como muitos outros escritores leitores de alma) de repente me entende mais do que eu mesma...
Enfim, hoje estou melancólica. Não gosto quando fico assim. Começo a pensar muitas coisas. Pensar me deixa com certa tristeza. Então isso se torna um ciclo maldito. Engraçado como justo assim, fui lembrar-me desse trecho. Pensando em coisas luxuriosas, que nada tem a ver com melancolia. Creio que tem algo nisso que me apetece... risos. Isso aqui tá muito conversa pra psicólogo dormir... Muitas profundidades da minha alma, dignas de uma boa sessão de psicoterapia. risos.
Gostaria de escrever mais sobre teoria da literatura, algo mais intelectualmente estimulante, mas estou meio tórpida agora. Creio que o sono.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Os étimos da vida

Não consigo fugir. Aqui vou eu escrever novamente sobre a língua portuguesa. Então, os exatos demais abstenham-se do meu texto. Ou não, porque esse assunto é supimpa. Falarei, brevemente (porque esse assunto me empolga, então vou tentar ser breve), sobre a etimologia, ramo dos estudos da linguagem que mais me fascina. Antes mesmo das figuras de linguagem. Aliás, esse interesse sempre existiu. Um dos motivos (talvez o principal) que me levou a fazer Letras - Port/ Latim.
É fato: o latim é o âmago de inúmeras línguas. Ele seria um dos sub-ramos do indo-europeu, essa considerada a proto-língua, a língua-mãe da maioria das línguas existentes (a minoria faz parte de outros ramos, como o afro-asiático e o sino-tibetano). O indo-europeu seria uma suposição de especialistas, por meio de estudos comparativos entre as línguas. Há apenas teorias, nada de provas sobre a outrora existência dela. E o latim é a língua que mais influiu na formação das línguas europeias, por conseguinte nas também faladas nas Américas e na Oceania (sem falar de alguns países na África também). Não vou entrar em detalhes históricos, sobre a dominação do Império Romano e tal. Vou falar exclusivamente sobre a formação dos vocábulos. Etimologia vem do grego etumon, "origem" e logos "palavra, estudo". Então, é o estudo da raiz, da origem das palavras.  
Gostaria até de ter feito ou ainda fazer, quem sabe, uma especialização nisso, mas penso que vida acadêmica não é pra mim.Vejo então que a única maneira de ganhar a vida com raiz seria fazendo agronomia e estudar plantações de tubérculos (tá, essa foi horrível). Enfim...
No momento, estudar etimologia configura-se apenas como um hobby, sem pretensões mais audazes.
Comecei, tem um tempinho, a ler "A Insustentável Leveza do Ser", de Kundera (então, minha alma aquietou-se um pouco para atividades mais intelectuais. Eu disse um pouco). Kundera utiliza-se de um casal, Tomas e Tereza (que às vezes torna-se um trio, com Sabina), para falar das relações humanas sejam amorosas ou de amizade, e faz reflexões filosóficas, sociais e até linguísticas. E é nesse ponto que me atenho, no capítulo (o livro é divido em partes que por sua vez são divididas em capítulos minúsculos) em que ele fala sobre a origem da palavra "compaixão" em várias línguas. Nas línguas derivadas do latim, a palavra é formada pelo prefixo com, que significa "junto de, com" e passio, que significa "sofrimento". Assim, significa sentir simpatia por quem sofre, sofrer junto, o que teria uma carga pejorativa. Mas nas línguas de origem eslava e germânica, há o prefixo equivalente, mais a palavra que significa "sentimento", como em tcheco sou-cit, polonês wspol-czucie, alemão mitge-fühl, sueco med-känsla. Ou seja,  nessas línguas, a palavra é empregada mais ou menos no mesmo sentido que "compaixão", mas reveste-se de uma aura muito mais elevada que a outra. Significa então, poder "sentir" todo e qualquer sentimento, não somente o sofrimento.
Com isso, podemos ver como a linguagem reflete a maneira de pensa de um povo. É como um arquivo, onde ficam gravadas várias informações relevantes sobre como a sociedade em questão via, percebia o mundo.
É redundante falar em diacronicidade em qualquer texto sobre etimologia. Mas o estudo diacrônico (estudo das formas contemporâneas comparando-as com as formas arcaicas) é interessantíssimo não apenas para ver pura e simplesmente a origem mecânica da coisa, mas também para ir a fundo e tentar entender o porquê da palavra ter tomado tal forma. A história, a filosofia e porque não a sociologia devem muito à etimologia.
Outro exemplo: a palavra "comer" em latim é edere. Por se usar muito o tal prefixo com (por vezes confundido com a preposição cum, talvez um venha do outro, suponho) junto ao verbo edere, acabou-se cristalizando, trazendo até nós a forma "comer". Mas e aí? Por que utilizavam com + edere? Porque, para os romanos, as refeições nunca eram feitas solitariamente. Era prática comum sempre se sentar a mesa para comer com mais pessoas. Com + edere = comedere. E passando por vários processos de perda de fonemas e tal, chegou ao nosso "comer" (estranhamente, bibere não era usado com o prefixo com, na minha opinião muito mais lógico, porque comer eu posso fazer sozinha, agora beber... Muito melhor acompanhado. Mas eles não viam a coisa desse jeito).
Eu gostaria de ficar aqui falando e dando exemplos, mas vai ficar muito chato pra quem tá lendo. Acho que é legal só pra mim essa parada (e pra quem compartilha do mesmo interesse...). Mas recomendo o estudo do latim a todos, porque com ele, muitas das vezes, nem precisamos de dicionário pra saber o significado de alguma palavra. E nem digo só nas neo-latinas não. Mais de 80% (não sei a porcentagem correta, mas é algo altíssimo mesmo) das palavras do vocabulário da língua inglesa e alemã vêm do latim. Exemplo que adoro é o da palavra estrela: estrella em espanhol, stella em italiano, αστέρι em grego (lê-se astéri. Coloquei o grego só porque sou fanfarrona.), star em inglês e stern em alemão. Preciso dizer a semelhança? Até em grego vê-se a origem. Outro exemplo: deletar. Vem do verbo latino delere, "apagar". Foi pro inglês to delet, e daí veio pro português. Ou seja, ela saiu do latim, pegou carona com o inglês e foi pra uma neo-latina, cujo curso natural seria vir do latim direto. Mas percebe-se uma imanência meio velada no português, como na palavra "indelével", "aquilo que não se pode apagar".
Sobre o que eu falei de não precisar de dicionário algumas vezes, aconteceu comigo outro dia, e fiquei tão feliz! Isso porque foi com uma palavra aparentemente difícil. "Procrastinação". Nunca me interessei em saber o significado, já tinha visto por aí e tal. Mas aí rolou de aparecer num texto, e na mesma hora tive um "insight": pro, "para frente", cras, "amanhã". Pronto! Ato de deixar algo para amanhã, adiar. Fiquei muito contente, sério mesmo. Pode parecer besteira para alguns, mas acho super satisfatório. Satisfatório, aliás, se eu não soubesse o que significa, é facilmente desvendável: satis, "muito",  facere, "fazer". Grosso modo, "algo que faz muito", ou seja, que enche... satisfaz! Outra palavra: essa nem foi eu que descobri, li em algum lugar e fiquei chateada de não ter pensando nisso antes: "Consideração". Com, "junto de, com", sideralis, "relativo aos astros". Num momento arcaico significou "pensar, confabular junto aos astros, aos deuses". Hoje também é pensar, confabular, mas infelizmente não olhamos mais tanto pro céu como deveríamos... 




sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Nostalgias

Farei um mergulho a minha infância, uma volta à passagem dos anos 80 aos 90, que, creio eu, a melhor época de se ter uma infância que uma criança pode ter. Eu e meu irmão fomos criados pela minha mãe (meu pai faleceu faltando um mês pro meu aniversário de 4 anos, meu irmão tinha 3 meses), pela minha avó e pelos meus numerosos tios. Devo gratidão a cada um deles. Acho que mesmo vacilante, mesmo insegura, mesmo um pouco ausente, minha mãe foi espetacular. E o mais legal dessa época é que mesmo não tendo a presença no cangote constante dos pais, as crianças viviam e se "criavam", por assim dizer, sozinhas. A violência era quase nula. A tv (algo de extrema importância) era inócua.
Quando não estávamos assistindo desenhos, estávamos jogando vídeo-game (primeiro Atari, depois Master System, depois o Super Nintendo, o divisor de águas, com o bigodudo italiano que cismava de salvar aquela princesa estereótipo de loura, sempre se deixando raptar: Mário. E o derradeiro Nintendo 64), ou brincando com brinquedos supimpas. E mesmo assim, nosso dia parecia ter 30 horas, tínhamos tempo de brincar com as crianças da vila (diga-se de passagem, bem parecida com a do Chaves). Ela ficava no Engenho Novo, bairro perto do Méier. Vivemos lá até os meus 11 anos, depois nos mudamos para um apartamento em Vila Isabel, até os meus 13. Depois fomos morar em Saquarema, onde minha infância começou a minar (não digo isso num mal sentido, é o fato).
Bom, o negócio é que pretendo agora listar alguns fatos e coisas de que me lembro, e creio agora já que não lembrarei de tudo. Mas as memórias continuam, aqui dentro. Para sempre felizes e sapecas como o acordar numa manhã de sol (na temperatura certa naquela época), tomar leite achocolatado (ou com café, vê-se agora onde começou meu vício) feito pela minha avó na mamadeira (tomei mamadeira até os 7 anos. Não me envergonho disso), assistir os desenhos do Programa da Xuxa ainda de pijama no sofá e depois brincar. E tudo isso, com a companhia inestimável de meu irmão, e já naquela época trocávamos desavenças, mas éramos amiguinhos inseparáveis. Brincávamos de playmobil, ele com o playmobil medieval, e eu com o playmobil acidente (sério, vinha um bonequinho grande e um pequeno, com gesso pra ambos, faixas e cadeira de rodas. ISSO era brinquedo). Ótimo era quando misturávamos com minhas barbies (sim, tinha muitas, e era ótima cabeleireira, pintava os cabelos delas de giz de cera.Também era ótima costureira, fazia várias roupinhas de retalhos), com os carrinhos dele, incluindo do Winspector, meu castelo da She-ra e muitas, mas muitas pecinhas de Lego. Éramos apaixonados por Lego. Tínhamos caixas gigantescas, e aqueles temáticos. Bom também era no São Cosme e Damião, saíamos pra pegar doces, e depois quando chegávamos em casa, colocávamos o cocô-de-rato e outros doces em tigelinhas e fingíamos ser cachorros, comendo nelas (vai entender cabeça de criança). Eu e meu irmão aprontávamos muito, nem vai caber tudo aqui. A gente mandava trotes, pegávamos os telefones comerciais que tinham no final da Revista Veja Rio e ligávamos, mas só meu irmão tinha coragem de falar palavrão. Eu ligava e no final ele mandava o atendente tomar no cu, ou se foder, algo do tipo, e desligava. Também derretíamos brinquedinhos de plástico, aqueles baratinhos com a base colada nos pés, na lâmpada do abajur, pra brincar de lanchonete... Sem falar do clássico tocar a campainha dos vizinhos e sair correndo né...
Brincávamos na chuva também. Altos banhos. Lembro de uma vez, sem minha mãe saber, que fui pro meio da chuva de guarda-chuva, no pátio, e fiquei ali sentanda, comendo bis. E quando quebrei o dente? Foi com nove anos. Peguei a bicicleta sem minha mãe saber (isso era prática comum entre mim e meu irmão), pra andar no pátio, e quando fui guardá-la, meu dente bateu no guidão e quebrou, chorei pacas e ainda levei esporro da minha mãe... Lembro também dos Natais e Anos Novos, era uma preparação! Todo mundo se mobilizava com os preparativos. Íamos comprar roupas e presentes. Almoçávamos cachorro-quente pra não sujar muita louça... Também adorava quando minha mãe levava a gente no trabalho dela, em dias especiais, como Dia das Crianças, e éramos tratados muiiiito bem por todos os colegas dela. Arrumavam um computador, e a gente ficava brincando no paintbrush.
E os desenhos? Caverna do Dragão, As aventuras de Mickey e Donald, Smurfs, She-ra, He-man. Também alugávamos fitas dos desenhos do Snoopy e da Turma da Mônica. Revistinha da Turma da Mônica então?? Toda semana, de lei. Aí vieram os animes, Cavaleiro do Zodíaco, depois Sailor Moon, e também aqueles seriados japoneses, Patrine (adorava!), Changeman, Winspector... Não assistíamos programas da adultos, mas não porque nos proibiam, mas porque não tínhamos interesse. E se acaso nós tívessemos, nossa mãe nos explicava docemente o porquê de não assistir (claro que muitas vezes fazíamos escondido, éramos capetas em forma de guri). Mas apesar disso, A inocência imperava, éramos crianças de verdade, em todas as acepções da palavra, na época em que devíamos ser.
Posso dizer hoje que, apesar das doideiras que faço na vida,  minha infância foi e é a espinha dorsal do meu caráter, e que ainda faz parte, como um grilinho falante inconsciente, das minhas escolhas. A aura dos anos 90 criaram as crianças, pro bem. E a parte do meu ser que é feliz, é feliz por causa da minha infância. E será até eu ficar velhinha caquética, sentindo uma lástima imensurável pelas novas crianças que são criadas ao som de eguinhas pocotós da vida.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

"Minha vida é tão confusa quanto a América Central, por isso não me acuse de ser irracional..."

Retornando do feriado de 7 de setembro, e agora ouvindo a srta. Janis Joplin, pensando nas nostalgias da vida... Janis tem esse poder sobre mim, mas acho também que o momento está propício para algumas conjecturas. Nesse feriado, vivi. Vivi, muito. Só o que fiz. Não pensei. Só vivi. Respirei. E vivi. Pensando estou agora. Três dias intensos. Hard Core. E não posso deixar de ligar tudo a minha "arianez", irrompida intensamente nesse ínterim de minha vida.Viver, intensamente, agir, depois pensar. Conquistar o que se quer, e ficar feliz com isso. Impulsos de energia, vitalidade. Saí, bebi, beijei. Curti, profundamente, a(s) noite(s), até quase de manhã. Dormia pouco. Acordava, e curtia também a família (altos papos com Carol, minha priminha projetinho de metaleira. Muitas afinidades, foda). O perfeito equilíbrio entre essas minhas vidas sociais. Amigos e família. Atenção devida a cada uma. Na verdade, quase... muitos amigos não visitados, mas para ficar satisfeita com isso precisaria de um mês de férias. Meu círculo de amizade está mais pra um icoságono. Cada um num canto. Pra quebrar um pouco, minha vida cultural está uma merda. Há alguns meses, comecei a ler um livro. Parei e comecei outro, que está ali agora me olhando, implorando pra ser lido. Minha falta de concentração anda absurdamente aguda. Não estou conseguindo pensar muito, apesar de me considerar um ser pensante que não se vê por aí com facilidade. Filmes? O último que vi foi "A Origem", faz um mês (!!). Nem comento peças de teatro e concertos de música erudita. Vontade eu tenho, me sinto culpada de estar tão intelectualmente pausada. Faz uns meses já. Minha vida deu muitas voltas, e ainda está dando, e sinto, nesse momento, como nunca, vontade de viver. E só. Agir. Agir. Agir. Sei que temos momentos de precisar parar, mas não quero agora. Por mim, tudo seria uma sucessão de festas, pessoas, sensações. Cores, sabores, cheiros. Uma amálgama de sensações, um êxtase aos cinco sentidos. Um chamado, sinto uma vontade incontrolável, e até estranha a mim, pois apesar de sempre viver mais do que pensar, nunca foi como está sendo agora. E no fundo, me sinto feliz com isso. Com esse empurrão que estou me dando à vida. Não sei se vai passar logo. Bom, cada um tem sua dose de momentos intelectuais que demanda sua alma. A minha pede, sempre pediu, desde garotinha, mas, nesse momento, non troppo. Nem sei o porquê da culpa (perfeccionismo rulando, as always...), e não estou mesmo num momento muito reflexivo, pra chegar numa resposta. Mas quer saber, estou sentindo um gosto imenso por essas urgências de voar pela vida. De só sentir. Irracionalmente, como animal que sou. Sentindo-me viva, radiantemente viva. E por ora, é só o que importa. É o que quero que importe. Farei na prática toda essa teorização? Contradizendo-me...


P.S.: O título é um trecho de Infinita Highway, dos Engenheiros do Hawaii. Ouvi no rádio hoje voltando pro Rio no carro do meu tio e bateu aquele sentimento de coincidências... A letra dialoga com o que sinto agora. Acho que é isso.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Tem pano pra manga aí?

No meu post sobre as Carmina Burana, falei que voltaria a vários assuntos, que creio eu, vou esquecer de falar. Prometo a vocês, meus três leitores, que farei um esforço em prol de não olvidar. Afinal, a vida de vocês não seria a mesma sem meus preciosos e magníficos textos (ah, esqueci, esse post não é sobre ironia...).  Anteriormente, disse que ia falar sobre certa figura de linguagem, a dona metáfora... Ela "figura" (com trocadilho, por favor) aqui então. E vou escrever sem colar, só na malandragem (porque todos nós sabemos que pesquisamos a lot pra escrever bonito né). Bom, começando pela etimologia (prato cheio pra mim> primeria metáfora hein!), metáfora significa "mudança de lugar" (meta> mudança; fora, forum> lugar). Então quando processamos cognitivamente essa figura de linguagem, nada mais fazemos que estar mudando de lugar um certo vocábulo-ideia. Quando digo "seus olhos são estrelas na noite ardente", percebe-se que fizemos relação entre duas coisas que aparentemente não tem relação nenhuma. Mas "forçamos" essa relação, por acharmos semelhança. Então, tcharam! Mudamos o "uso usual" (não achei nada melhor do que essa redundância absurda: licença poética, ok?) tanto de "olhos" quanto de "estrelas". E com isso, formamos uma nova ideia, só possível pelas semelhanças que vimos! Em "noite ardente" temos sinestesia, outra figura de linguagem que, ao meu ver, forçando um pouco a barra, também é um tipo de metáfora (etimologia: syn> ao mesmo tempo; estetis> sensação. Quanto ao stetis não tenho certeza, mas quase. O nome pra essa figura de linguagem veio de uma certa condição que acomete certos humanos, mas pra mim, na real, o que ocorre é que esses humanos tomam ácido e a Medicina acredita mesmo que eles ouviram um vermelho-berrante. Brincadeira, creio na existência de pessoas sinestéticas). Voltando à metáfora propriamente, ela às vezes é algo bem particular. Se dizem que "sicrano é um cão" só entendemos se bem explicado por quem fez tal relação... Podemos apenas supor, baseado na ideia que temos de cão. Um animal, de quatro patas, que late, baba, copula com qualquer cadela no cio... Mas não sabemos ao certo o que quis dizer a pessoa que disse, que aspecto canino ela quis salientar... E muitas outras figuras de linguagem, são na verdade, também metáfora. Vejamos a metonímia, que pela etimologia, nos indica também uma mudança. Mudamos um nome com seu "uso usual" pra outro. Quando dizemos bebi um copo de cerveja (primeiro exemplo que me veio à mente; hoje é sexta e estou aqui escrevendo isso e não estou bebendo cerveja...), não pegamos o copinho de vidro (o melhor pra cerveja, né) e enfiamos guela abaixo. Trocamos o conteúdo pelo continente, para haver um melhor entendimento. E já é algo natural para nós. Todos entendem que o que bebemos foi a cerva, e não o copo (mas sempre tem um engraçadinho, geralmente que fez Letras ou entende do bordado, pra fazer comentários do tipo: cuidado, vai se machucar "bebendo" o copo!). Outro exemplo, o "neguinho". "Neguinho entra na net e fala um monte de merda" (monte de merda, outra metáfora...). Em algum momento, alguém apropriou-se do diminutivo de negro, tascou uma apócope (acho que é esse o nome. Não estou pesquisando NADA aqui), e transformou em neguinho, pra indicar qualquer ser humano. Então, usou uma raça específica pra representar todo e qualquer ser humano de qualquer raça. Mais um exemplo: "andei meio sumido". Estamos usando o verbo andar, que, por ser uma ação elementar ao ser humano, cai como uma luva  pra indicar que vivemos de tal modo (cai como uma luva, uma metáfora composta de expressão inteira... Que linda! E o "como" aí, parte integrante de outra figura de linguagem, mas essa muito pobrezinha, nem vale muito a pena falar dela, a comparação... Muito trivial). Então, tomamos essa ação básica inerente a todo humano, em detrimento de todas as outras... Eu poderia ficar aqui eternamente dando exemplos. ADORO!! "Metaforizamos" como respiramos. All the time. Atentemos agora para a catacrese. Essa ganhou um nome feio, e lamento, não sei a etimologia agora. Braço da poltrona, batata da perna, dente de alho... Na verdade, a catacrese é uma metáfora que deu tão certo que cristalizou-se. Ninguém usa mais nenhuma outra analogia pra essas específicas, aquela parte da poltrona, o desmembramento da cabeça de alho (olha aí). Dá pra perceber que uma tênue linha separa cada uma dessas figuras de linguagem. No fundo, é tudo a mesma boa e velha metáfora. Uns sabidões aí que inventaram de dividir. Tudo farinha do mesmo saco! (ops, outra metáfora). Assunto que dá pano pra manga esse...Ops, outra metáfora...

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Sobre a nobre arte de escrever

Vamos ver se sai alguma coisa que preste... Digo isso, porque me creio bem enferrujada na antiquíssima arte de grafar numa base símbolos (com seus significantes e significados) que possui minha língua nativa e que meu processo cognitivo me propicia a entendê-los e fazer-me entender por outros que compartilham da minha língua-mãe - Escrever . Eu, que fiz Letras, sou indagada por Deus e o mundo se escrevo. E digo (com vergonhas internas, não sei se justificadas... Quem faz Letras TEM que escrever?) que não... Bom, até essa feliz ideia de finalmente ter um blog. Porque eu já havia pensado nisso, mas nunca tive a coragem (sim, exatamente isso) de pegar, sentar e começar a escrever pra valer. Na verdade, tenho até uns contos meio toscos que escrevi faz alguns anos... Que infelizmente, acho que os perdi. Se eu os encontrar, postarei aqui, porque, modéstia à parte, ficaram muito bons (apesar de toscos). É difícil alguém chegar e dizer isso... MEU TEXTO É BOM. É o que vejo por aí. As pessoas são incrivelmente modestas, fazem de um tudo para explicar, justificar o seu texto. Bom, eu mesma era assim. Agora, taco um foda-se. Quem quiser ler, e se identificar, ou achar só mediano, ou bom, ou excelente, ou uma merda, paciência... Sinceramente acho que esse texto agora, está muito ruim. Vim aqui para escrever algo significativo, algo frutífero... Mas não sei. Escrever (algo que preste) não é fácil. Mas, se pararmos pra pensar, escrevemos o tempo todo. Metaforicamente falando, claro, mas sim, escrevemos. Na verdade, terminamos de escrever o que outrem começou. Quando lemos (coisa que fazemos, creio-nos pessoas letradas que vem aqui ler minhas débeis linhas...), estamos construindo o texto junto com o escritor. O escritor, sem o leitor, não escreveu nada. É uma ponte intrínseca, peça-chave fundamental do escrever. Se escrevo um belíssimo poema, como já o fez Fernando Pessoa, Clarice Lispector, Carlos Drummond (os utilizo como exemplo por serem fáceis de lembrar aqui e agora, pois dentre os tipo de texto, poesia é meu menos preferido, então, por conseguinte, minha lista de poetas é ridiculamente ínfima), e sim, estou me comparando a eles; se eles, eu, você que escreve um poema, e o guarda no fundo de uma gaveta, você realmente escreveu? Escreveu? Sim, cruamente, colocou símbolos com algum significado pra você no papel (ou qualquer outro suporte). Mas... What's the point? Acho que até é válido escrever, e após um longo tempo, você mesmo ler de novo o que escreveu. Eu aliás, tenho diários, longos escritos, na minha fase de passagem da infância pra adolescência. É tão estranho lê-los hoje... Hoje me dizem muito, mas muito mesmo. Um novo diálogo comigo mesma. Mas, voltando... Escrever e esconder, ou jogar fora, estamos poupando outras pessoas de de repente, se encantar, ou ter ideias, com o que escrevemos, mesmo se achamos que se trata de uma bela porcaria... Então, é preciso comunicá-lo, levá-lo ao entendimento de outra mente pensante (configura-se aqui o leitor), para enfim, um texto nascer. Um texto nada mais é do que uma parede construída faltando tijolos, que serão colocados por vocês, leitores. (metáfora usada pelo meu professor de Lit. Bras. VI, no primeiro período da faculdade, que nunca mais esqueci). Estancando agora  minha linha de pensamento, e mudando (ou voltando) o rumo desse texto, aqui vejo o quanto escrever se equipara a tantas coisas que prescindem de prática. Andar de bicicleta, tocar um instrumento, beber, amar... Estou escrevendo, mas sinto meus dedos e minha mente um tanto confusos, desengonçados. Com o tempo, escrevendo mais, sei que poderei tornar-me um às da literatura! (risos). Aproveitando o ensejo (e mudando o rumo novamente... Minha mente não consegue focar muito tempo num ponto), falarei da metáfora. Estava lendo sobre isso num outro blog, e também é uma questão que sempre anda comigo, a incrível formação, o processo de formação da metáfora (e de tantas outras figuras de linguagem... sou aficcionada nelas, acho fantástico!). Sabe, acho que isso vai dar pano pra manga (com o perdão dessa última metáfora)... Então, como quem começou a escrever sem saber o que escrever, até que me estendi por demais... Para não ficar enfadonho e espantar ou pouquíssimos leitores que tenho no momento, acho melhor postar somente (risos) isso. A metáfora fica pra próxima. Nossa, como meu poder de síntese (e de foco) é quase nulo... Preciso trabalhar isso. Ou não! Talvez esteja inaugurando um novo estilo de escrita, só meu... Por que não? Um belo dia alguém irá dizer sobre mim: "...blá blá blá, Juliana, cujo estilo se baseava na prolixidade, mudança constante de foco e uso excessivo de parênteses, reticências e metáforas..." Acho que, no fundo, tenho mais a escrever do que eu outrora imaginava...

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Carmina Burana - Canções dos Beurens

http://www.youtube.com/watch?v=QEllLECo4OM
Poemas dos goliardos (monges e eruditos errantes), encontrados em Benediktbeuern (cidade alemã) no século 19. Carl Orff os musicou, apesar de encontrar junto com o códex um andamento musical, indicando que já eram propícios para tal. A temática gira em torno da Fortuna, deusa romana da antiguidade, em quem os povos antigos depositavam fé, e acreditavam dona de imensos poder e influência na vida (também acham? pois é...), com o dom de ora dar, ora tirar. Pausa pra falar da Antiguidade: todo mito é uma metáfora, claro, mas na sua origem, numa época em que as pessoas realmente acreditavam nos deuses e nos seus poderes, as parábolas (atrevo-me a dizer que a da deusa Fortuna mais que outras) eram de extrema importância, chegando a guiar o rumo da vidas das pessoas, como hoje o deus cristão é para muitos (não vou entrar aqui nas questão de que os cristãos "afanaram" muitos dos mitos e ícones da mitologia dita pagã. Isso é papo pra outro dia). A ciência das coisas da vida, do natural (e do sobrenatural também), são assuntos que o homem desde a antiguidade se ocupa em estudar, entender, e os mitos vieram na tentativa de explicá-los. E mesmo numa época em que eles não mais acreditavam piamente nos mitos e nos deuses, ainda assim prestavam respeito e davam o devido valor a outrora forma de ver o mundo (lembrei agora das feiticeiras de Horácio... praticando o culto à Hécate, faziam simpatias, patuás... algo como uma macumba braba da Antiguidade. Depois escrevo sobre elas.). Voltando ao códex, ele foi escrito numa época (nesse ponto que eu queria chegar) em que os tabus e a noção de pecado ainda não estavam disseminados no pensamento do homem. Século XIII, ainda na gênese dos dogmas cristãos, os monges (e as pessoas em geral), viviam suas vidas, experimentavam os prazeres dela sem culpa. Sem relacionar, qualquer momento de júbilo, à ideia de que eles eram "maus" e iriam para o inferno serem cutucados eternamente pelo tridente de algum demônio. Ler Cícero, ler Catulo, entre outros, nos mostra que para eles, a ética e o bem portar para com as outras pessoas (em suma, ser uma pessoa boa, de bom caráter), nada tinha a ver com o fato de copular com trocentos garotinhos e garotinhas bêbedos de vinho, encher a pança com faisões e leitões e depois dormir 2 dias seguidos. A merda do cristianismo que fez isso com a nossa mente. Pra eles, isso nem era um problema, não havia assimilação entre uma coisa e outra. Tentar imaginar, tentar ter a mesma mentalidade é algo extremamente difícil, e na minha faculdade (fiz Letras- português/latim), éramos obrigados (no bom sentido) a exercitar esse pensamento.Quando digo que é difícil, é porque nós, que somos "modernos" e livres das amarras religiosas que conduzem a vida de muita gente boa, mesmo assim, a noção de pecado não deixa nossas mentes. Sei disso. é algo que é intrínseco à nossa formação, à nossa criação numa sociedade majoritariamente católica. Ler os clássicos, e penetrar na mente dos autores, tentar "incorporar" a realidade da sociedade, era ao mesmo tempo prazeroso e complexo. Já é complicado fazê-lo com um autor moderno e brasileiro, imagina com um autor romano de "apenas" 20 séculos atrás. Comecei a escrever esse texto pra falar dos Carmina Burana, pois faz tempo eles não saem da minha cabeça. Mas alguém pode pensar: estou falando de poemas escritos na Baixa Idade Média, mas também fazendo uma mistureba, falando da era Antiga... Tudo bem, 13 séculos  poderia ser um tempo considerável para mudanças no pensamento humano.Coisa na qual NÃO acredito. Visto que, hoje em dia, o homem  me parece mais medieval (no sentido pejorativo que muitos atribuem) do que os próprios homens medievais. Certos procederes e pensamentos se arraigam na mente humana como um carrapato sedento de sangue o faz num vira-lata, e não mudam assim. É passado por gerações e gerações. E gerações. Vejo essa sociedade em que vivo, como as pessoas ainda são machistas (ok, modelo romano patriarcal impera aqui mesmo, mas não quer dizer que não se possa mudar. Mirem as marchas feministas, que considero até radicais... ops, assunto também pra outra ocasião), são tão atrasadas intelectualmente falando... Deparo-me às vezes com certos indivíduos que fica difícil acreditar que não estou lidando com um camponês que acabou de chegar numa máquina do tempo direto de seu feudo no interior da Alemanha do século XIV... Bom, acho que não estou madura o suficiente culturalmente falando, sou garota ainda nos profundos conhecimentos da humanidade. Mas de uma coisa tenho certeza: muitos dos males da sociedade atual poderiam ser curados (ou evitados), com uma leitura incisiva dos clássicos, ou generalizando, de quaisquer textos deixados pelos antigos (sejam romanos, gregos, egípicios, chineses, celtas...).
Enfim, vida longa à ANTIGUIDADE!! AVE!!


P.S.: A roda da fortuna levou-me agora a uma bela associação com um símbolo de extrema importância para uma outra sociedade antiga que também venero, os celtas... Falo da triskel... Assunto também pra outro post. ;)


P.S.2: As questões tratadas no meu primeiro post foram superestimadas por mim... Nisso que dá, como ariana nervosinha e ansiosa que sou, sair escrevendo de cabeça quente. O diabo nem sempre é tão feio como a gente pinta. Hoje tive um ótimo diálogo com meu chefe, que elucidou vários pseudo-problemas. Mas a luta continua... =)

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Da auto-sabotagem

Primeiro post. E logo sobre algo que aconteceu hoje. Já com assunto pra escrever!Yes! Fui chamada a atenção no trabalho. Não quero que isso aqui se torne um muro das lamentações, a minha intenção hoje, ao fazer o blog, era (é) escrever sobre coisas cotidianas, leves... até levianas. Já agora percebo que vindo de mim, pode até vir a nascer posts assim, mas também haverá muita coisa pesada, complexa... Difícil de engolir (até de ler). Mas acho que preciso desabafar. Enquanto não posso pagar um bom psicólogo... rs. Então é isso. Meu chefe chamou minha atenção, por um erro que deixei passar num anúncio, e foi publicado assim. Ele é super legal, veio me dar apoio e tal... Isso me atingiu como um soco no estômago. Perfeccionista que sou. Desde que me formei, sempre quis trabalhar com revisão de textos. Sonho. A realidade, é que ainda não me adaptei. Muitas mudanças... Emprego novo, casa nova, cidade nova. O Rio é velho conhecido meu, mas 15 anos após sair daqui, voltar pra cá, é um puta baque. É o terror da violência, do trânsito, do estresse das pessoas... Tendo que me acostumar com isso a jato. E ainda mais com coisas novas e boas que estavam me acontecendo na minha velha cidade, Saquarema. A vida tem dessas ironias filhas da puta. O fato é que está difícil. E meu chefe veio conversando comigo, que eu pareço meio desinteressada, meio displicente. Pode até ser o que está parecendo, mesmo no fundo querendo muito acertar. Gosto disso aqui. Mas ao mesmo tempo, creio que tem uma vozinha dentro de mim que fica falando ao meu inconsciente (ou subconsciente, sei lá): "você era mais feliz antes, o que você tá fazendo aqui?". Sinto-me como se tivesse caído de paraquedas. Ou permanentemente bêbada. Tudo rodando, girando, sem achar ainda um ponto de apoio. Espero, de verdade, não estar praticando auto-sabotagem. Até meu chefe, que me conhece há menos de um mês (e parece ser um cara sensível, é músico e tal), já percebeu. A questão é: vou deixar isso continuar, ou esganar essa vozinha que está indo contra a corrente, contra minhas vontades? Na verdade, quais são de verdade minhas vontades? Preciso ser sincera comigo, ver o que realmente quero. E quando a gente acha que o que a gente sempre sonhou não é mais aquilo tudo? Tinha uma visão diferente (a velha história, a grama do vizinho sempre parece mais verde)... Acho que só preciso de mais um tempo. Pra me acostumar. Vim com muita sede ao pote, achando que tudo ia ser as mil maravilhas desde o início. Sem obstáculos, sem dificuldades. Enfim, não quero perder, não quero me render. Preciso me esforçar mais. Acho que é isso. Bom, no final isso aqui tá uma droga de primeiro post. Conversinha pra psicólogo dormir. Tô meio deprê. Espero que o amanhã me acorde mais ensolarado... Independente do tempo lá fora.